quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Tragédia Grega.

Esta era para ser uma carta de despedida, porém, ao longo das linhas e entrelinhas foi se tornando uma tragédia grega. Ao pensar no fado ao fim, lembrei-me do começo e como tudo parecia um conto de fadas, não poderia ser, nos contos de fadas todos vivem felizes para sempre. Ouvir isso era praticamente uma comédia para mim, tão desacreditada. O personagem de uma tragédia tentando salvar-se acaba condenando-se ao aniquilamento, e esta fui eu refletida no contexto de pontas de cigarros, garrafas vazias e promessas que caiam por terra. O meu oráculo foi o tempo, que me avisara que eu e ela não éramos para ser, desde o começo. Porém, na vontade de fugir dessa previsão assombrosa, eu buscava nela o que me faltava, e quase sem querer, achava muito facilmente. Ela era uma mulherzinha difícil de lidar e precisava que tudo fosse feito em seu tempo, ela também não sabia manter promessas, mas disso eu já sabia. Contudo eu sempre acabava nos braços dela falando algumas merdas sobre destino e coincidências. Mas as linhas dionisíacas estavam traçadas, e todos os pedaços que ali se mantinham já haviam sido emendados de outras peças que o fado do fim pregava em nós. Se estavam emendados, estavam mais suscetíveis a uma nova quebra. E foi de fato o que aconteceu, e não sobraram pedaços para serem colados mais uma vez. E não era eu que iria ficar na escadaria catando os pedaços, dessa vez, o aniquilamento estava completo. Não fui tão radical como Édipo, mas no final de tudo tornei-me cética. Olhar para aquela mulherzinha difícil me fez pensar que talvez eu não precisasse de todo esse drama na minha vida e que poderia ser mais fácil do que imaginável querer coisas simples: respeito, caráter e autenticidade. E eu tinha certeza que essa seria a última vez que escreveria para ela.

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Ampulheta.

Eu sempre tive uma estranha fixação com o tempo, e secretamente ironizava aqueles que se confortavam no poder que culturalmente o foi atribuído; o tempo que cura, o tempo que perdoa, o tempo que esquece. Porém, eu parecia experienciar um outro tipo temporal. E não era aquele em que fazia tudo parar em momentos lisérgicos. Era algo mais caótico, mais mortal; o tempo que adoecia e o tempo que destruía. Relações duradouras que se desgastavam e desapareciam, como a areia de uma ampulheta, se esvaindo no desespero de aproveitá-la ao máximo. Parecia que o tempo se recusava a manter relações. Tempo polivalente, tempos difíceis. Eu, como uma boa apreciadora dos sarcasmos, tentava ignorar boa parte das provocações que ele me fazia. Portanto, de tempos em tempos eu cedia ao adoecimento que ele me trazia; o corpo alcoolizado dava lugar a um coração doente e desacreditado, um poço niilista, para ser mais sensata. Ás vezes não adianta lutar contra e acusar as coincidências, o caos tem o seu lugar, por mais que tentamos evitá-lo, vem de tempo em tempo. O melhor que eu fazia era tomar algumas doses, escrever alguns poemas e me erguer em tempos de ressaca, e digo-lhe, era uma tarefa mais difícil do que esperar que ele curasse alguma coisa.