quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Hablas Español?

Segunda-feira e os ares haviam mudado, os ventos sopravam para uma direção oposta, era um novo começo de semana, um novo começo. Entre pausas para tragos de cigarro e goles de whisky, eu já havia andado alguns bons kilometros sem qualquer direção, e finalmente parecia estar chegando em algum lugar, os fluxos aumentavam gradativamente e ensurdecedoramente: carros, pessoas, angústias. Era o centro do inferno. Sentei em um ponto de ônibus, para mais umas daquelas pausas que repunham a nicotina e esquentavam a alma. O garoto sentado do meu lado parecia estar fazendo a mesma coisa, e foi logo esboçando uma conversa. Ele estava mais bêbado do que eu, e era apenas duas horas da tarde de uma segunda-feira, foi aí que me simpatizei com ele. Caio Graco, heterônimo de um certo político romano que defendia as classes populares e enfrentava a facção conservadora, irônico, pois ele realmente era um comunista que vinha do México, apenas com uma bolsa cheia de garrafas de tequila e com alguns trocados nos bolsos rasgados. Ele também não sabia para onde estava indo, naquele ponto a minha simpatia havia se transformado em gosto. Ele tinha traços finos que realçavam um rosto juvenil e um corpo de homem, e ele era o mais viril que eu já havia conhecido. Graco, como passei a chamá-lo, não me abordou para uma conversa com intenções sexuais, aposto que ele estava muito bêbado para conseguir pensar nisso. Foi naquele instante que eu quis a compania dele, juntamos minha jornada e a dele, e criamos um novo universo de coisas. Vamos caminhar a noite inteira e falar um pouco de merda, tudo vai nos levar ao mesmo lugar, mas, enquanto isso, aprendemos a aproveitar enquanto o tempo não nos ultrapassa. Tudo passa.

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Paralelos.

Domingo em fim de noite, eu contava cada segundo da minha última noite de trabalho antes de tirar minhas tão aclamadas férias, enfim um intervalo para a viciante rotina. A banda que alí tocava me devia mais uma última música, os amplificadores estavam mais sonoros e beijos nos bastidores enalteciam meus últimos momentos de redenção alí. Ao colocar meus dois pés para fora daquele lugar pude respirar fundo, a ponto de sentir o peso dos meus pulmões, estranho alívio. Eu estava em terra de zumbis, e ás duas horas da manhã, as ruas transbordavam de amarguras e arrependimentos. Eu caminhava e enquanto isso traçava um paralelo entre aquela cidade e minhas mãos, que pareciam não envelhecer nunca. Entre elas havia um mundo de coisas, e todas essas coisas no meu mundo me faziam pensar em ir embora. Porém, ir embora era a pior coisa que eu parecia poder fazer, essas coisas ainda valiam a pena. Eu precisava de novos ares, novas experiências, novos lugares para depositar minhas alucinações, rotinas me cansavam. Tentei caminhar para casa, mas acabei me perdendo entre bebidas e mulheres, mais uma vez. As páginas do meu diário continuavam vazias enquanto os nomes nas minhas paredes já não cabiam em si. Acordei no dia seguinte, mais uma vez ao lado de uma morena que eu parecia nem reconhecer, elas sempre pareciam muito. Juntei meus trocados do que restara do meu último pagamento, coloquei a guitarra nas costas e peguei a garrafa de whisky barato em cima da mesa. Eu precisava conhecer o outro lado do inferno.


Jullie,
não esqueça de pagar as contas do mês,
estou tirando férias, trarei presentes.
Mantenha nossas paredes cheias,
tragos de whisky e goles de cigarros,
Lorena.
17/02/1988

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Manhã Seguinte.

São raros aqueles momentos de sobriedade e eu, naquele ponto, tentava aproveitá-los ao máximo. Eu vivia entorpecida de anfetaminas, dopaminas, fluoxicetinas e todos os outros tipos de derivados que se podia imaginar. E foi aproveitando dos meus minutos de sobriedade, que me flagrei pensando em um descanso, para meu corpo, minha mente e meu tédio. Sentada no sofá, acendi um cigarro e pensei em sexo durante minutos que pareciam horas, o que para mim já era algo novo, pois antes eu não conseguia pensá-lo, apenas vivenciá-lo. Ao fim da divagação conclui que abstinência sexual não é para mim, decanso para a alma, não para o corpo. Acendia mais um cigarro, divagava e tragava fervorosamente. Eu gostava de sexo alucinante, precisava dos meus lisérgicos. Conclui que abstinência de adições antes, durante ou depois do sexo não era para mim. Descanso para o tédio, não para a mente. Acendia um outro cigarro, eu nunca fui de lembrar nomes e traços, acabei me desapegando de detalhes, lembrar era sempre a parte mais difícil. Resolvi que precisaria ainda das minhas garrafas de whisky temperadas com dopaminas, garantia a amnésia no dia seguinte. Por fim era tudo um ciclo vicioso, descanso quando eu morrer. Sexo mata.