terça-feira, 29 de março de 2011

P (r) onto.

Era nosso último dia ali e a escassez de dinheiro, cigarros e dignidade começava a gritar. Porém ainda tínhamos uma dúzia de garrafas de destilados e afrodisíacos, se era o necessário para esquecer a escassez, beberemos. As gotas de alcool pareciam evaporar em meio à todos aqueles sedentos pelo último dia, últimos goles. Lembrei, em um flash, de ter falado a ela mais cedo:
-Hey, não vamos desmaiar hoje.
Mas havia me esquecido da resposta. Eu a fitava com uma garrafa na mão, trocávamos olhares de desejo, ela também tinha uma garrafa na mão. Sem que ninguém percebesse ela entrou no quarto, quase deixando um convite para mim. Entrei. Nenhuma de nós duas soltou as respectivas garrafas. A joguei na cama e nos envolvemos com tal intimidade que adormecia até a ponta dos meus dedos. Nos misturávamos no suor, nos lençóis e no afrodisíaco, que a essa altura já coloria toda a cama. Sentávamos, falávamos algumas besteiras, ela falava algumas besteiras enquanto eu desenhava todo seu corpo em meus dedos. Colocava uma roupa mais ou menos, saia do quarto, pegava mais uma garrafa e voltava. Quando começava a amanhecer nos lembramos das noites que passávamos juntas quando nos conhecemos, com essa mesma intimidade, naquele lugar tão longe dalí. Havia tanto tempo que não fazíamos isso. Eu perguntei qual tipo de relacionamento tínhamos, ela não soube responder, tão pouco quanto eu. Naquele momento pensei o tanto ela me fazia bem e o quanto a queria por muito mais tempo. Ela tinha uma teoria sobre continuarmos fazendo apostas de quanto mais duraríamos, talvez assim, por alguma razão que fez sentido na cabeça dela, superaríamos as expectativas de apostas ou as nossas próprias. Mas avisei prontamente que só apostaria se ela pagasse, como não havia feito das últimas vezes. Aposta?

Faz?

Pegamos a primeira estrada rumo a qualquer lugar. No carro, a música embalava no mais alto volume e todos cantavam ao som das estradas. Clapton, Stones, Cash; eles contavam nossa história quase que magicamente. E toda vez que esta trilha tocava, nos tocávamos, sinestesia de canções em sentimentos. Depois de cinco horas de asfalto pareciamos chegar em algum lugar, era uma pequena cidade concentrada em volta de uma praça onde todos se perdiam por ali. Nos instalamos em uma casinha que aparentemente não caberia nem metade de todos aqueles que começavam a chegar. Sem hesitar pulei logo no quarto que tinha uma cama de casal, joguei minha mochila sobre a cama e ali me sentei veemente afirmando aquele cômodo. Ela me observava de longe, às vezes ela não entendia muito bem o que eu fazia, mas não a culpo, quem entenderia? Eu a fitava da cama e tentava chamá-la para dentro, ela negava balançando a cabeça e rindo, ás vezes eu também tinha que buscá-la. Buscava, fechava a porta do quarto e a beijava pelo máximo de tempo que conseguia e em dois minutos ela já estava lá fora, sentada no sofá, acendendo um baseado atrás do outro. Nem mesmo nos fins de noite conseguíamos esboçar alguma preliminar sexual; ou eu estava desmaiada em algum lugar da casa ou ela estava muito chapada para se mover de qualquer lugar que ela havia se instalado. Éramos aquele tipo de casal que ficavam sem condições até para trepar, quem diria.

quinta-feira, 24 de março de 2011

Carnival.

Era época de festas e a cidade se aquecia para receber todos os tipos de pessoas que se alegravam com aquela ocasião. Eu não era uma delas e permanecia reclusa na minha varanda, dançando com minhas garrafas e meu maço de cigarros que cheiravam a fim de festa. Eu espiava conhecidos, desconhecidos e semi-conhecidos esparramados sobre o chão daquele apartamento, pessoas que eu nunca nem havia partilhado um gole de histórias ébrias. Foi quando alguém teve algum tipo de insight e sugeriu que partíssemos, para qualquer lugar, em qualquer estrada, na direção oposta àquela cidade que nos próximos dias se tornaria o pior pesadelo daqueles que não se adaptavam ao Carnaval, máscaras. Foi como um sino de alerta, quando todos se levantaram e catavam restos de cigarros, bebidas e pontas de marijuana para colocar na mochila. Viramos o sofá em busca de moedas ou alguma coisa que o valha. Desviei o olhar para minha garota, que espreitava na porta do quarto, procurando um sentido para toda aquela comoção. Coloquei as poucas moedas que achei no bolso e caminhei em direção a ela.
- Eu tenho uma passagem para qualquer lugar - eu disse.
Ela, que desconfiava de tudo, me olhou meio de lado, esbanjou um meio sorriso e foi em direção ao banheiro. Ela gostava de me deixar em situações em que eu não entendia nada. Pouco depois ela voltou, quase que pronta e me disse:
- Está esperando o que? - colocando a mochila nas costa e indo em direção à porta.
Se eu não aparecesse nas escadarias em 5 minutos eu sabia que ela iria sem mim. Juntei rapidamente as bitucas de cigarros e as garrafas de afrodisiacos, destilados e amnésicos e desci, mais uma vez, rumando em direção do nascer do sol. Partimos.