quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Saudade.

Eu nunca fui muito de desabafos, mas este se faz necessário, estava consumida por nostalgia e um pouco de indisciplina. Há um ano atrás eu deixava o meu lugar preferido, caminhava com pesar pelas areias me vendo obrigada a retornar àquela velha rotina que me derrubava, conseguia lembrar, não, sentir, o peso das botas que não queriam ir embora. Mantive alguns amigos, perdi alguns amores, mas a cidade sempre ficava, e dela lembrava com saudosismo lacunar. Era dia trinta, antes tão simbólico e hoje tão vazio. Eu estava sentada no sofá e ao som de uma canção qualquer que falava sobre sempre se sentir jovem, me recordava em tragos daquelas montanhas que eu só conseguia subir até metade, ouvindo meu pulmão sucumbir às escadarias ingrimes. Lembrava também das montanhas que desci e descobri prazeres que nenhuma viagem de alucinógeno poderia explicar. Conheci mexicanos que não bebiam tequila, japoneses viciados em sexo, russas que não pareciam com atrizes de filmes pornô e italianos que não eram charmosos, poderia ter me surpreendido, mas apenas me desvinculei de rótulos. Me apaixonei, pela primeira vez, pela simplicidade das coisas. Aquela cidade gritava liberdade e eu costumava a caminhar pelas ruas sorrindo, sem motivos aparentes, mas tão transparentes a qualquer olho nu. Conheci pessoas para se guardar por uma vida, apaixonei-me carnalmente também, mas essa já daria uma outra história. Voltava a mim e espreitava o meu redor, a realidade agora era outra, a respiração chegava até a doer, pois que doa, de passo em passo eu conseguiria chegar lá, mais uma vez.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Sem limites.

Era tempo de cotidiano e os acontecimentos seguiam àquela rotina perturbadora que tanto me assombrava. Eu acordava cedo, de ressaca, escrevia algumas palavras ao vento, soltava alguns termos infelizes, acendia um cigarro e me encolhia no sofá com dores no fígado. Algumas pessoas passavam por mim e me mandavam parar de beber tanto, e se eu não estivesse beirando o alcoolismo, talvez as ouviria. Naquele ponto minha saúde física era só um detalhe e eu me confortava em doses de qualquer coisa. Passava o dia achando explicações em canções e acordes, ás vezes esboçava algumas composições, mas só saberia falar do caos. Quando a noite caia eu tirava forças da abstinência e me levantava em direção ao bar mais próximo, me juntava a poucos bons amigos, que eu desconfio que também dançavam no limítrofe alcoolista, e passávamos a madrugada falando besteiras e trocando flertes com as garotas que ali ficavam. Eu poderia conhecer uma dúzia de pessoas durante a bebedeira, que no dia seguinte não lembraria sequer de suas feições, só reconheceria quando acordasse com alguém do meu lado, e era aquela mesma história de sempre, o esforço do re-conhecimento:

- Aceita um café? - eu disfarçava amnésia com amistosidade.
- Sem açucar, por favor.
- Dormiu bem?
- Pouco, mas bem.
- Hum... - e vinha o silencio do desconhecimento.
- É Ana, caso você não se lembre.
- Ora, você acha que eu esqueceria?
- Você se lembra?
- Claro, Ana. Vamos voltar para a cama.
- Okay. - e ela parecia saber o caminho para o quarto melhor do que eu.



quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Primeiros Passos.

Cheguei em um ponto da minha vida onde, aos poucos, ia deixando de lado todos aqueles prazeres hedonistas. Passei a notar detalhes, expressões, percebia o que nunca havia sequer, me preocupado em perceber. Eu andava pelas ruas contando os passos obsessivos daqueles que tinham pressa, eu sorria com ações gratuitas; a bailarina que fazia malabares nos sinais e cativava com o olhar simples e talentoso, o mendigo que andava com dificuldade com as mãos abertas em busca de algum trocado e quando o conseguia esboçava um sorriso de lado, que mascarava, por alguns segundos, a tristeza que ali o rondava, havia também o moleque que entregava papeis nas ruas, de pés descalços, desejando a todos um bom dia. Parecia que eu havia me libertado de todo aquele individualismo que abrangia todos que ali passavam, vinha de repente uma vontade de sentar com eles e saber de suas vidas, aprender malabares, mais humildade, me libertar do peso dos sapatos que distinguiam tanto uns dos outros. Os prazeres eram diferentes, mas eu poderia sentir que a essência era a mesma, eu me identificava naquela calçada e todos os dias eu caminhava pelos mesmos lugares, observava até os grafites nas paredes, e um deles me encarava todos os dias dizendo: "nunca é tarde para mudar o tempo". Nunca é.

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Se Essas Paredes Falassem.

Certo dia quando cambaleava pela casa, me escorando nas paredes, lia de relance cada frase ali escrita, cada palavra, cada desabafo. E no rodapé de um canto repleto de vazio, um texto tímido espreitava, em giz negro, dentre todas aquelas palavras com cores e poéticas. Ele dizia:
"Eu tentei, não mais do que valia a pena, não menos do que meu orgulho me permitiu. Ouvi meias mentiras, falei meias verdades. Minhas verdades que omitem junto com suas mentiras que machucam. Eu não tentei mais do que deveria, não esperei menos do que ganhei. Afinal, já estava tudo escrito, não é mesmo? Se era pra ser destino, ele apenas acenou para nós. Por mais que eu te queria por perto, estava muito longe do real sentimento. Escrevo timidamente neste canto pois amanhã posso ter outros encantos. Quando o ler, poderá se identificar, se não, haverá outras poesias que farão mais sentido em qualquer outro lugar. Se as linhas parecerem tortas é devido ao meu estado, que pesar. É hora do ponto final, deixaremos as reticencias apenas para o passado.
Lorena
07/08"

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Mesmice.

De volta às noites de inverno daquela cidade que eu já poderia chamar de minha. Era a volta ao caos que a mesmice trazia, mesmo procurando novos lugares, eu sempre acabava com as mesmas histórias. Não tinha muito tempo que eu havia saído de um relacionamento e conclui que a melhor solução seria de conhecer novas pessoas.Tanto meus relacionamentos amorosos quanto os pessoais andavam de mal a pior e ás vezes eu sentava em pubs e iniciava conversas aleatórias com qualquer um, era o conforto da solidão. Ás vezes não necessitava nem de puxar alguma conversa, eu apenas trocava olhares, trocava sorrisos amarelos, entrava em algum banheiro com uma expressão convidativa, quase sempre dava certo e mais uma vez eu acordava em lugares desconhecidos ou não sabia como havia voltado para casa. Eram, ainda, as mesma histórias. Em uma dessas noites de mesmo fim, eu olhava intensamente para uma garota, sorrindo, flertando, ela notava, mas parecia não ter coragem para algum outro movimento, ou estava apenas assustada com aquela bebum à encarando. Depois de um tempo quando notei que não ia dar em nada, me levantei, com um grupo de pessoas que se sentava ali comigo e caminhava lentamente rumo a outro qualquer lugar. Ela me cutucou por trás e me entregou um papel com o endereço de um pub onde eu poderia achá-la mais tarde, eu sorri, a convidei para se perder comigo, mas ela insistiu que eu fosse para aquele pub no centro da cidade. Eu neguei e continuei meu caminho. Mais tarde, naquela mesma noite, após várias doses e discussões filosóficas, eu me flagrei com aquela vontade de aparecer, cambaleando, no pub do centro; e como eu nunca fui só de ficar na vontade, não hesitei em ir. Chegando lá, a esperei pacientemente e quando ela me espiou, ela soltou um sorriso e me atacou com avareza, ou seria luxúria, eu não saberia dizer. Não trocamos nem meias palavras, e ela me perguntava: "você costuma a fazer isso sempre?" - eu apenas respondia com sorrisos. No dia seguinte, eu acordei procurando respostas para aquela pergunta: não, não faço isso sempre.