segunda-feira, 26 de novembro de 2012

A Arte de Enganar a Si Mesmo.

Não me viram passar por aqui. Eu não passei por aqui. Eu nunca estive aqui. Me diziam que se você repetir uma mentira várias vezes ela se torna uma verdade. Eu não sinto, eu não sinto, não sinto...eu poderia facilmente acreditar nisso. Eu até apresentava alguns sintomas de aceleração de batimentos cardíacos, de saudade ou de fixação, mas eram apenas comorbidades do meu vazio. Sentava no canto oposto da mesa de bar e me embriagava de sentido, não sinto. Me diziam que o que os olhos não vêem, o coração não sente, embriagava meus olhos com detalhes de fundo. Porém, o que os olhos vêem, eles devoram. A carne de tão fraca me tornava em apenas pele, e eu já não contava mais verdades a mim mesma. Poderia passar noites na companhia de pensamentos insistentes, mas no fim, tomava algumas gotas de algum sonífero e preferia não pensar. A mentira mais comum é aquela que usamos para enganar a nós mesmos e eu insistia em não sentir. Slogans estampavam verdades que eu não queria ver, preferia o conforto do engano. Os olhos que devoravam eram os mesmo que esqueciam. O coração que insistia em não ver, era o mesmo que dilacerava em silencio. Não me viram padecendo. Eu não padeci. Eu nunca padeci. 

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Ode Ao Poeta.

Era fim de tarde daquela efêmera primavera e eu caminhava a passos largos e cambaleantes em direção às escadarias de casa. Eu que não era de guardar detalhes, parei de repente frente a alguns rabiscos no muro que me acompanhava silencioso, eram novos escritos. Alguns esboçavam romances, outros se rebelavam nas próprias palavras e se embaralhavam em incompreensão e alguns poucos me chamaram atenção; poderiam ser meus escritos de outrora. O muro tão silencioso passava a sussurrar respostas por clichês. Um dos escritos dizia: Atrações físicas são comuns, conexões mentais são raras. Me perdi e me achei ao longo do mesmo segundo, acendi um cigarro, pensei e tentei me recordar da última vez que eu havia achado essa conexão. Não havia muito tempo, porém, eram de fato, raras essas pessoas que haviam passado por mim. Lembrei-me de uma pessoa em especial, ela rodeava o limítrofe de todos os meus sentimentos, e no final do dia conseguia ir embora com tanta facilidade. Nunca tivemos a oportunidade de ter algo que beirasse o estável, não por falta de qualquer coisa que o valha, mas pela velha mania de complicar o que poderia ser tão simples. Nossos corpos exalavam atração, a conexão ia além da mental, era neuronal: algo tão complexo que se dava com tanta rapidez e tamanha facilidade. Mas faltava poesia, ela costumava a dizer. Faltava poesia à minha compreensão das coisas. Nunca fui de sair poetizando, mas na verdade, acredito que a poesia só existe em quem a sente. Eu via poesia até no nosso modo ímpar de se odiar. Eu havia tirado aquele resto de noite para pensar nela, misticismos a parte, sentia que ela também fazia o mesmo. Se isso não for poesia, foi apenas incompreensão. 

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Vitium.

A cidade cinza denunciava novos tempos que estavam por vir, o Sol não aparecia há dias e até a pressa dos passos nas calçadas faziam uma sinfonia triste e melancólica. O calor flamejava nos corações vazios e queimava em abstinência de velhos vícios. Os desejos latentes se afloravam junto à palavras perversas. Toda vez que o tempo mudava naquela cidade, acontecimentos de mesmo tom surgiam. Para mim, o cinza havia trazido recaídas, recheado de nostalgia e saudosismo. Eu, que clamava por redenção alguns meses antes, me encontrava em metade vício e metade razão. Nunca fui de optar pela razão ao invés do prazer, alías, tinha pavor dos que faziam isso; mas eu era metade prazer e metade inconsequência. E sabendo que a razão nunca iria prevalecer em uma recaída, pedi para que o vício o respondesse por mim. Ele não respondeu, ele só queria existir dentro de mim e eu só queria consumi-lo até que nada mais restasse. Queria tê-lo para sempre, mas não em forma de abstinência. O cinza também coloria todo o caos que pairava sobre aquelas dúvidas. É o querer, o poder, mas o não dever. Um pouco de sensatez seria de grande valia em uma dessas discussões comigo mesma, mas eu era metade coração e outra metade vício.No fim de tudo, todas as promessas que eu havia feito para mim haviam caído por terra e eu permanecia parada em frente a um espelho, fumando um cigarro atrás do outro, espreitando a presença do vício em meus olhos, em todo meu corpo abstinente. Sabia que se cedesse por um breve momento ficaria sempre na vontade de mais. Vitium, minha falta. Sou metade vontade e outra metade falta.

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

O dia em que me surpreendi com as mulheres.

Eu sempre fui uma grande apreciadora da dinâmica feminina; dos jogos de sedução, da inconsistência de promessas, dos flertes silenciosos e das incertezas dos momentos. Eu sabia muito bem lidar com tudo isso, a cada dia um novo drama, e por trás de cada drama diversas complicações. Mas eu me sentia tão cansada de esperar em cada relação a certeza de um caos, que eu evitava qualquer tipo de relacionamento que envolvesse mais de vinte minutos de conversa que pudesse gerar algum mal entendido e confundir-se com algo parecido com intimidade. Sempre me disseram que intimidade era uma merda; e eu só fui entender isso quando senti a cobrança que o intimo envolve. Antes eu só pensava intimidade como andar pelada pela casa sem que esse alguém achasse estranho, ou até mesmo propor algumas bizarrices no sexo sem que a pessoa se assustasse e te confundisse com um parafilo ou algo do tipo. Olha que surpresa, mais um daqueles dualismos; a intimidade tinha, também, dois polos. Mas foi evitando relações que me surpreendi com as mulheres; descobri que estava me relacionando com meninas. Não precisava ser tão complicado assim, me disseram. Mas a simplicidade me parecia tão chata, que me recusei a acreditar que todos aqueles meus nomes nas paredes eram apenas meninas brincando. E eram, e eu me cansara delas, finalmente. A cada persona, uma mulher. A cada mulher, uma surpresa. Elas tem cheiro de estrógeno, me disseram. Eu nunca soube o cheiro de estrógeno, mas percebia a mulher com atrativos irresistíveis. As meninas que brincavam eram alimentadas de muita ilusão. Acreditavam dizer tudo, apenas com o despir de um vestido. E ao querer satisfazer tudo, sucumbiam sob pena de não fazê-lo e nada satisfaziam, mantendo o vazio que, na necessidade de ser preenchido, se preenchia com inseguranças. Não é em qualquer esquina ou em qualquer bar que se acha mulheres, me disseram.