segunda-feira, 29 de abril de 2013

A moça que colecionava pessoas.

A primeira impressão que se tem de alguém é raramente a que fica. Eu a havia reconhecido em uma tarde no parque, eu lia algumas filosofias baratas enquanto ela vendia votos de amor. Entre frases de Sócrates traduzidas por Platão, tudo tornou-se platônico. As trocas de olhares já eram familiares e eu não sabia muito bem me esquivar do charme de bons vendedores, acabava comprando todas aquelas palavras bonitas. Essa não é mais uma história em que eu acabava em alguma cama qualquer; dessa vez, acabei em uma prateleira. Só para colecionadores. Ela era uma moça linda, e ela sabia bem disso, a usava muito bem para artifício de negócios. Eu realmente gostava dela, ela me cativava como poucos. Porém aquele lugar na estante não era tão confortável assim, principalmente por ter que dividir tal espaço com tantos outros que pareciam gostar de ocupar aquele tão estreito pedaço de lembrança. Eu já não gostava de dividir nem mesmo um trago de cigarro, quem diria um coração. E por vezes eu desaparecia, mas sempre voltava com os bolsos cheio de votos e  notava a crescente coleção; todos ali reunidos, sorrindo e fingindo que aquela pequena prateleira - que ficava cada vez mais apertada - era suficiente. Talvez fosse, mas não para mim; que a pouco, havia apagado todos aqueles nomes das minhas paredes, para que não pairassem em um instante que não era o deles. Pairados, parados, guardados do passado em uma vitrine que vendia o presente. Eu acabei preferindo encontrar com aquela bela moça apenas por casualidades, sem transparecer nada que poderia ser negociado. 

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