segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008
In-cômodo.
Era precisamente Junho de 1977, época em que a brilhantina virava pó, o pó entorpecia e a juventude vivia de simbólos e rebeldia. Eu, era daquele tipinho de revolucionária comum, sem nenhum toque especial, vivia suja e perdida por esses buracos que chamavam de clubes. No auge do punk-rock, e meus 18 anos estagnados a quase um ano inteiro, sai de casa, a princípio para uma volta pelo parque. Mas o ínico da minha Lou-cura me levou para outros cantos. Com um único maço de Marlboro no bolso, uma garrafa de whisky barato na mão e a guitarra no ombro, passei do parque e fui me dirigindo em direção à estação. Na cabeça, além de entorpecentes, havia a ânsia de achar alguma coisa que meu ceticismo poderia aceitar. Peguei o trem das 22hras na estação principal daquela cidadezinha de caos, chamada Horibe. Eu não sabia ao certo para aonde aquele trem ia, só sei que ele apenas ia, e para mim era mais do que o suficiente. Em um piscar de olhos(e uns goles de whisky), o trem já seguia para o Sul, e em mais alguns piscares de olho(e mais uns goles) a minha garrafa já estava na metade. Foi quando me deparei com os olhares cruzados e desaprovados daquelas 3 pessoas que compartilhavam o pequeno cômodo do vagão comigo. A senhora do meu lado não parava de fitar minha garrafa e meu cabelo mal lavado. Ignorei. Olhei para a placa de "Proibido Fumar', ironicamente sobre a minha cabeça. Foda-se. Acendi um cigarro, e dei um demasiado gole no whisky. A mesma senhora, olhou, encarou, desaprovou, e silenciosamente se levantou, se dirigindo para outro in-cômodo do vagão. Coloquei os pés sobre o assento dela, e fiquei imaginando se ela era claustrofóbica, muda ou se ela simplismente não quis estabelecer nenhum diálogo comigo. Olhei para o casal na minha frente, que por acaso pareciam bem frustrados com a relação deles, e fiquei imaginando quanto tempo deveria ter que eles não faziam sexo. O homem me olhou, como se tivesse adivinhado meus pensamentos, respirou fundo, e surpreendentemente me pediu um trago. A mulher, surpresa, levantou-se perplexa e saiu do vagão. Tudo isso no mesmo silêncio perturbador de antes. Mas como se o marido tivesse lido os passos dela, ele encostou, deu dois tranquilos tragos, me agradeceu e foi atrás dela. Voltei aos meus demasiados goles de whisky e pensei na ironia das coisas. Eu, que havia pagado menos do que o preço da passagem convencional(pela falta de dinheiro, claro), estava alí, em um cômodo sozinha. E alí, a alguns vagões a frente, centenas de burgueses haviam pago o triplo, talvez o quádruplo para ficarem nessa mesma posição. Há há há. Otários!
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Ai, menina.
ResponderExcluirVocê escreve bonito por demais.
Esse seu ar junkie que cativa (e você sabe) fica ainda mais real em palavras.
Virei fã, mais que antes, mais que sempre.
;*