domingo, 13 de abril de 2008

Contorno.

Sexta-feira, 6 horas da manhã e eu voltava para casa cambaleando, me recostando nos muros e me apoiando nas paredes numa tentativa de caminhada após mais uma noite corrompida de trabalho. Chegando nas escadarias do prédio, tentando achar minhas chaves do portão, que eu perdia em média uma vez por semana, pude notar alguém escorado e desmaiado bem na entrada. Eu só conseguia pensar no conforto da minha cama e tentei pular e passar por cima daquele ser infeliz que havia bloqueado minha passagem para o céu. Porém, devido ao meu grau de in-sobriedade tudo que eu consegui foi cair em meio à aquela tentativa falida. Cutuquei-a umas boas centenas de vezes e ela nem mexeu. Imaginei que talvez estivesse morta e resolvi chutá-la, primeiro de leve, afinal se realmente estivesse morta não iria fazer mal nenhum. Ela se mexeu, e aparentemente eu havia perdido a noção da minha força, porque depois eu fui ver o tamanho do roxo que eu deixei marcado. Ela lentamente foi abrindo os olhos, como se fosse a primeira vez. Era aquela ruiva maravilhosa, dela eu não havia me esquecido. Falei para ela se levantar e estiquei minhas mãos oferecendo ajuda, mas acabei caindo ao tentar puxá-la. Uma sequencia de risos antecedeu alguns segundos de silêncio, que pareceram infinitos. Ela parecia sóbria e eventualmente fui descobrir que ela estava sóbria, de fato, ela só gostava muito de dormir, e dormia aonde encostava, é uma arte. Ela me disse que havia chegado 3 horas da manhã alí na minha porta e ficou tocando o interfone por algumas horas. Jullie provavelmente estava em casa, mas ela nunca atendia o interfone, o telefone ou nem mesmo a campainha, nunca tinha condições para isso. Entrando em casa, Jullie se encontrava sem roupa, desmaiada no sofá. Eu falei para a ruiva não se importar, e ela não se importou, na verdade ela era adepta ao nudismo público no ápice da loucura, é uma arte. Ela passou dias lá em casa, e depois do segundo dia resolvi perguntar o nome dela, já estava ficando estranho eu contornando e inventando adjetivos para chamá-la. Belle, de bela, e de fato era. Depois de duas semanas me vi entrando em algum tipo de relacionamento menos casual e mais sério e isso me assustava.

- O que será de nós? - me perguntou nas primeiras horas do dia.
- Eu gosto de você. - respirei fundo e torci para a palavra "namoro" não vir à tona e contornei - Vamos ficar ficando. - continuei.
- Do tipo você só comigo e eu só com você? - disse ela acendendo um cigarro.
- É. - eu disse aliviada de pelo menos ter contornado e evitado o peso da palavra.
- Me parece ótimo. - ela sorriu, me deu um beijo e foi para a varanda acabar seu cigarro.

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